Às vezes é difícil entender o “por quê” do sofrimento, especialmente quando concluo que o problema somos nós, sociedade. Como todo ser humano viajo na tentativa de racionalizar essa sensação da descoberta e essas tristezas que me acompanham. Você deve falar: “nossa, alguém, você se descobriu soropositivo, sabe que a contaminação foi nos últimos meses, começou a medicação em função de uma situação rara em soropositivos, é mais do que normal que você sofra!”
Sim, obviamente a rotina que tenho agora ela é, no mínimo, “chatinha”. Tenho que tomar quatro comprimidos antes de dormir e posso considerar quase nulo os efeitos colaterais. Esses medicamentos vão quase zerar a quantidade de HIV no meu sangue, aumentar minha imunidade e diminuir em 96% o risco de transmissão do vírus para meu “possível” parceiro sexual em caso de acidente. Eles também podem aumentar taxas de triglicerídeo, colesterol, glicose... portanto alimentação saudável se faz necessária.
Além disso nunca tive nenhuma doença em função do HIV, felizmente nunca senti mal (fisicamente). Por que há tanta pressão em nós, soropositivos?
Racionalmente não há motivos para tanta tristeza, visto que é uma doença que pode ser controlada quando há boa aderência ao tratamento. Por que são tantos os dilemas? Por que isso deve influenciar nas relações interpessoais, seja com familiares, amorosa, amigos, trabalho? Por que viver minha soropositividade na sombra?
Essas respostas passam por um medo internalizado que tenho das reações das pessoas? Sim! Se o preconceito está no outros por que tenho eu que pagar por pensamentos que, muitas vezes, não compartilho? Por que os outros nos ferem tanto? Por que para muitas pessoas um vírus em meu organismo é tão mais relevante do que tudo que eu sou e o que sinto? Por que tenho lidar com problemas de aceitação alheia? Quem deveria fazer terapia? Eu ou a sociedade? Por que me enquadrar num padrão de relação tão pré-concebida em estereotipias construídas socialmente?
A base é a mesma do racismo. Os preconceitos bebem da mesma fonte.
Enquanto não encontro respostas, vou tentando fazer alguma coisa com o que fazem de mim.
“Aidético!
Viado tem AIDS!
Sangue sujo!
Não sente onde ele sentou.
Preto é porco!
Não tenho preconceito, mas filha minha não namora preto!
Sapatão gosta de barraco!”
E você, o que vai fazer com isso?????
10 comentários:
Sei lá o que fazer com isso. Porque dizer que a opinião dos outros não me afeta é ter a ilusão de que vivo numa ilha de conforto e que sou imune às agressões que os outros se esforçam para fazer sobre mim.
Mas um primeiro passo que eu acho importante é esse que vc fez: perceber que nós não somos culpados do preconceito que recebemos.
A partir daí eu não sei mais direito qual seja o caminho, mas posso dizer que é bem mais tranquilo caminhar quando a gente não vira alvo dos próprios preconceitos e da culpa por algo que não é nosso...
Abraços!!
sinto q fui indiretamente citado nesse post, ou estou enganado?
sobre o preconceito eu concordo plenamente com o q vc disse, e com o que nosso amigo Cara Comum falou aqui.
mas tem uma coisa boa nesse texto q talvez vc não tenha percebido, vc tá começando a aceitar sua condição agora com mais naturalidade, ou não? q vc contaminou-se com uma doença crônica, mas q não é uma sentença de morte. vc até falou em futuro parceiro...
gostei de ler isso
gostei mto de ler isso
Vou postar aqui um comentário que deixaram pra mim certa vez que acho que se encaixa perfeitamente nessa reflexão:
"É que a história é contada do ponto de vista dos vencedores e, convenhamos, numa assembleia convocada para decidir quem é o louco em que estivesse você contra todo o mundo, você perderia...paciência."
Abração!
Infelizmente a sociedade anda com a mente tão fechada, tão quadrada com pensamentos ignorantes que se transformam em todo tipo de preconceito...
Eu mesmo tenho algumas atitudes preconceituosas, às vezes preconceito de mim mesmo, embora aos poucos a vida vai me ensinando e vou aprendendo, afinal a vida é uma lição, cujo temos que ter a mente aberta para lidar com cada situação.
Forte abraço!
Cara Comum, nossa como sinto falta de seus comentários quando você dá uma sumidinha. Rsrs Acho que o caminho vai sendo feito, né?! Vou desconstruindo alguns preconceitos meus, criando outros, e principalmente aprendendo a lidar. Aceitar NUNCA, acho que opto mais por ajudar a desconstruir. Um forte abraço com saudades, pois tava sumido. RS
Foxx, pois é, vou sobrevivendo as pressões da vida, e me expressando como sinto cada momento. Percebi só depois da citação que vc viu. Serve mesmo! Mas acho que futuro parceiro... sei não. Antes já tava difícil, agora então... deixo pro destino e não faço minha parte. Rsrs Um beijo grande!
Lobo, permita-me discordar de sua posição. Acho que essa opinião que deixaram no teu blog reflete um pouco a máxima “o que não tem remédio remediado estar”. Não concordo e acho que temos grande poder de mudar essa questão. Não podemos desconsiderar a luta dos movimentos (seja do HIV, negro, homossexual...) nessa desconstrução. Perder uma assembléia não significa perder a causa. Paciência, aqui, NUNCA! Um grande abraço!
Ro Fers, excelentes palavras! Acho que tudo vai mudando aos poucos, né?! Também tenho milhares de preconceitos, mas vou tentando quebrá-los quando os percebo. Um grande abraço!
Tá, eu sei que estou sumido. Mas isso de desaparecer é da minha essência... Vou tentar fazer visitas mais frequentes, tá?? Abraços!!
Retificando: "...remediado está." Se bem que no meu caso também cabe "remediado estar." srrsrsrs
Seu post é uma explicação mais detalhada da máxima que diz que o maior problema da AIDS está no preconceito... Seu texto deveria ser usado pelo ministério da saúde...
Nossa Gato, Ministério da Saúde... gostei! Tenho percebido que não há nada mais democrático do que o preconceito. Ele está em todos os lugares, grupos, meios, sem nenhum preconceito. rs Abraço
Caí aqui,via FOXX e posso te afirmar que o preconceito,infelizmente,é o maior de todos os problemas.Seja em qualquer situação.
Um grande amigo meu é soro positivo e sei bem o que ele tem que passar.
Muita força!
Abração!
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